"Mataria para ser como tu" diz Mr. Ripley |
"Fútil": eis um adjectivo pouco simpático
que é atirado a esmo contra qualquer pessoa ligada à moda, às artes, que viva
lindamente ou que tenha alguma aura vagamente glamourosa susceptível de
provocar despeito. Não me interpretem
mal: eu não posso com gente verdadeiramente fútil. Embirro mais do que
ninguém com os blogs de trapos sem conteúdo, ou com quem não arranja nada mais
elevado para fazer senão ir ao cabeleireiro ou aos nails corners da
vida, e mais ainda com quem só se entretém no comentário da vida alheia porque
(pobre ou rico, com berço ou sem ele) não tem coisa mais útil para passar o
tempo. Then again, o
"glamour" nisso tudo é algo discutível.
Volto a bater na mesma tecla: não é possível
entender de moda nem de "assuntos de sociedade" ou o que seja sem ter
um bocadinho de cultura, conhecer algo de arte, de história, de literatura, e
sobretudo sem ter um pouco de chá e
de mundo. E mundo, e chá, é o
que falta a muito boa gente (mesmo a quem foi "comprar cultura" à
faculdade) que atira o argumento da futilidade a torto e a direito sem
justiça, a par com o da "falta de humildade" (do qual também saca imenso).
O fundamento para chamar fútil aos outros nunca
varia muito: "esse nunca precisou de trabalhar"
(leia-se, só eu é que sou uma grande pessoa porque tive o azar de não
nascer rico; claro que caso se pilhassem no lugar de quem criticam, fariam mil vezes
pior) "é uma menina do papá" (idem...e se fossem mas era
trabalhar e deixassem os pais dos outros?) e por aí fora, no melhor modo de
quem é invejoso e não pode ver uma camisa lavada a um pobre. Por mais
culto, refinado e caridoso que seja o alvo do "projéctil da
futilidade" está sempre condenado.
E o mais giro é observarmos quem critica. São
honrados lavradores, irmãs de caridade, eremitas estoicos? Não, minha gente.
Daí ainda podia vir alguma lição de moral. E essa é a parte interessante. Quem tem a
língua mais afiada é a gente que faz leasings (ou espera vir a fazê-los assim
que puder) para não andar de pandeireita, porque Deus nos livre que o verniz
muito recente se note se circularem num carocha (como muita gente bem nascida
que conheço e que não precisa de passear numa bomba para se afirmar); é a seita
que estoura o ordenado a recibo verde nos restaurantes ridículos "da
moda" cheios de gado bravo que não interessa a ninguém nem que não goste
da comida, só para ver e ser vista; que dá tudo e mais oito tostões para
aparecer nas páginas "do social"; que faz instagrams cada vez
que come sushi; que até prefere Coca Cola bem fresquinha (tal como eu!) mas
faz-se passar por connoisseur e
só bebe certos vinhos, e não fuma senão charutos embora deteste fumo. No fundo gosta dos passatempos "do povão" que
se sabe e nem o esconde, mas...o
pretensiosismo pode muito!
Em última análise quem mais critica a futilidade
(ou “mania”, outro termo preferido) alheia, com ganas tais como se de ofensa
pessoal se tratasse, são os mesmos aspirantes a novos ricos que lambem as
botas, que fazem todos os salamaleques quando um dos "fúteis" está
por perto, e que venderiam a alma ao diabo para serem convidados por um deles para
sua casa - e contar aos amigos, claro, que tinham estado com "fulano de
tal", que de repente passa a ser uma óptima pessoa. Criticam o que
tentam imitar, não passando nunca de uma cópia contrafeita, baratucha e amarga.
Se apesar de tudo isso tanta concentração em
criticar o alheio os fizesse ser melhor do que os outros no seu ofício, ainda
se admitia. Mas não. Na volta, cometem gaffes até na sua área de especialidade.
Pior que a futilidade, desde que seja uma futilidade consciente, só a pálida
imitação da mesma: a imitação invejosa e ingénua, tingida da parolice mais
absoluta. E futilidades, como snobismos, todos temos.